A pergunta da professora parecia simples:
− O que precisa para se ter uma família?
− Irmãos! Responde uma das crianças.
E a professora, então, problematiza:
− Sem irmãos não tem família?
− Tem. Responde outra criança. E continua sua explicação:
− Eu não tenho irmãos. Eu só acho que o Bruno é meu irmão porque a gente é muito amigo e eu quero muito ter um irmão!
− Então você não tem família? Provoca a professora.
− Tenho, meu pai, minha mãe e eu. Só três.
− E o que precisa para se ter uma família? A professora retoma.
− Pode ter família que só tem dois.
− Quem seriam esses dois? Questiona.
− Um pai e um filho… Ou uma mãe e uma filha… Reflete outro aluno.
Mas a professora é insistente:
− Mas o que precisa para se ter uma família?
− Às vezes pode ser só o pai e a mãe sem filhos… Coloca outro.
− Família é um grupo de pessoas que… tipo… tipo… Faltavam palavras para a garota expressar sua ideia, mas um colega a ajudou:
− Família é quem vive junto! E outro, ainda acrescentou:
− Família não pode ser de um, precisa ser de dois, três ou um monte.
− É, família tem vovó e vovô, tio e tia, primo e prima e também madrinha!
E como as crianças pensam juntas, a professora nem precisou interferir porque logo outra colocou:
− Família é como uma comunidade, só que menor.
− Quando tem um monte de pessoas que a gente gosta muito!
− Então nós somos uma família? Pergunta a professora.
− Não, nós só somos amigos. Responde uma das crianças com convicção.
− Mas se a gente se gosta? ? A professora provoca.
− Mas não temos o mesmo pai e a mesma mãe. Responde outra para ajudar o colega.
− Então o que precisa para se ter uma família? A professora não desiste.
− Uma família pode ter pai, mãe, pode ter dois pais, pode ter duas mães. Explica um dos garotos e seu amigo complementa:
− É! Pode ter mãe que não é casada com o pai!
− E os filhos podem ser da mãe e do pai e também podem ser adotados. Explica outra.
− Como o João que é adotado! Constata mais uma. E João se coloca:
− Quando eu fui adotado eu era sozinho, nasci da barriga de outra mãe. Só que ela não teve condições de cuidar de mim, me deixou no abrigo e aí meu pai e minha mãe me adotaram e agora eu tenho uma família.
− Isso mesmo! Comenta a professora. Os filhos não precisam vir da barriga, podem ser adotados! Mas o que precisa para se ter uma família?
E a conversa continuou. Singela e profunda. Com seus jeitos concretos de pensar, às vezes com muita desenvoltura nas palavras, às vezes nem tanto, as crianças refletem juntas sobre questões tão complexas e fundamentais da atualidade, como o conceito de família. E como são sabidas!
Luciana Fevorini
Diretora Escolar
(O texto foi escrito a partir do áudio de algumas aulas da professora Eliana Ponciano Eduardo com o Grupo Interidades – crianças de 3 a 5 anos – de 2016, em que desenvolveram o projeto “Quem sou eu?”.)