Como escolher uma profissão?

 

Uma reflexão sobre o currículo, mundo do trabalho e autoconhecimento. 

 

“A juventude sonha e muitas vezes sonha certo, mas na falta de meios e instrumentos eficazes, permanece em estado de sonho. A vida adulta, para que o imaginado assuma formas efetivas, torna-se criação, construção, cultura, conservando os gostos da criança que brinca, do jovem que deseja.”

Snyders, G. – “Alunos Felizes”

 

Quando um jovem chega ao Ensino Médio, a pergunta “Qual profissão você pensa em seguir?” é inevitável. Será colocada por familiares, pela escola, por amigos e até por ele mesmo. Pode parecer aterrorizante ter que decidir com essa idade a profissão que se terá “para o resto da vida”. Afinal, ainda há muito que conhecer do mundo e de si próprio. Mas evitar pensar sobre o assunto também gera muita angústia.

A ideia de que em algum momento se estará pronto para escolher é um pouco equivocada. Mais do que obter muitas informações sobre o mundo profissional, até saber “tudo” para depois escolher, o essencial é, para um jovem do Ensino Médio, prestar atenção aos seus interesses e gostos pessoais, aos conteúdos do currículo escolar que o encantam e o desafiam e aos que o desanimam e parecem sem sentido, às atividades das quais gosta e que sente prazer ao se dedicar, mesmo sendo difíceis. Todos esses aspectos colaboram para a decisão do que fazer e com que trabalhar. Também é importante ficar atento às suas reações afetivas, pois é impossível realizar uma escolha, seja por uma profissão, seja por um simples prato num restaurante, sem levar em conta as emoções com que reagimos.

Escolher uma profissão é muito mais do que escolher um curso ou uma faculdade, é acertar-se nos rumos da própria identidade e definir uma forma de atuar socialmente. O curso ou faculdade é um primeiro passo nesse sentido. Em quais áreas atuar? Com quais objetos de trabalho gostaria de lidar profissionalmente? Como conciliar o prazer do trabalho com sustentabilidade financeira? Quais os benefícios sociais que o trabalho pode gerar? Estas são algumas das questões que os jovens se colocam e que ainda estarão presentes em muitos momentos da vida profissional de um adulto, ou seja, esse é um processo interminável.

O trabalho de Orientação Profissional no Colégio Equipe tem como objetivo que os alunos entrem em contato com a questão da escolha profissional não só para conhecerem melhor o mundo do trabalho, mas também para se conhecerem em relação às profissões. É fundamentalmente um trabalho de autoconhecimento, em que cada jovem é incentivado a pensar sobre o que o emociona, o que julga importante, o que o desafia e o que tem vontade de conhecer mais e experimentar fazer. Quanto mais esse desafio é enfrentado, melhor é esse processo de escolha.

Partindo desse princípio, criamos situações para informar objetivamente nossos alunos sobre as profissões, o mundo do trabalho e os cursos universitários, mas também oferecemos espaços de debate para que os alunos reflitam sobre por que gostaram ou não do que viram e ouviram, para que reflitam sobre seus projetos de vida e o que gostariam de realizar pessoalmente e socialmente.

Na 1ª série, os alunos participam do Dia da Informação Profissional – DIP, organizado pela 2ª série, orientados a compreender, diante de qualquer profissional que escutem, o que mobilizou sua escolha e que marcos de sua trajetória de estudo e trabalho permitem a atuação profissional que tem no momento. A conversa coletiva posterior ao DIP abarca esses aspectos, para que os alunos identifiquem conteúdos trazidos pelos profissionais, que possam fazer com que eles queiram entender mais sobre determinadas profissões.

Durante a 2ª série, a questão do Trabalho é um dos eixos curriculares. São realizados projetos de pesquisa sobre Educação e Sociedade, nos quais é possível articular formação e trabalho; e sobre o Mundo do Trabalho e o Imaginário do Trabalhador, quando então são estudados trabalho formal e trabalho informal. Além disso, há a discussão sobre em que medida é possível dizer que um trabalhador escolhe um trabalho ou “é escolhido” por ele.

Por isso, é a 2ª série a responsável pela organização do Dia da Informação Profissional – DIP, que é parte de um projeto iniciado com o levantamento de ocupações pelas quais cada um dos alunos da turma já teve interesse em algum momento, e de atividades profissionais pelas quais se apresentam atualmente interessados. Esse levantamento permite a alguns alunos a identificação de objetos comuns ou habilidades requeridas que se repetem ou se atualizam pelas diferentes faixas etárias.

As profissões que farão parte do DIP em cada ano são definidas por discussões da turma, que costumam considerar: o maior interesse atual manifestado pelos alunos da série, diversidade de profissões em relação ao DIP organizado pela turma da 2ª série anterior, diversidade de áreas do conhecimento e possibilidade de apresentação de profissões novas e profissões tradicionais.

Ainda é parte deste projeto a elaboração de roteiros de questões a serem enviados previamente aos profissionais; a definição das áreas de atuação/perfil dentro de uma profissão, para a indicação e o convite aos profissionais; a preparação de alunos da 2ª série que apresentarão o projeto à 1ª série e dos que atuarão recebendo os convidados e coordenando as conversas entre os profissionais recebidos e os alunos de 1ª a 3ª série. Além da atenção sobre fatores individuais mobilizadores da escolha de curso e sobre marcos da trajetória pessoal de estudo e trabalho, já destacados para a escuta desde a 1ª série, a reflexão sobre como os profissionais atribuem sentido ao seu fazer é também colocada para a 2ª série.

Também na 2ª série, os alunos realizam uma pesquisa junto a seus pais ou adultos que tenham por referência, para conhecer como se deu a escolha pelo curso que realizaram, em que medida esteve aberta ou limitada e por quais fatores; se está ou não satisfeito com o que faz, quais expectativas foram ou não alcançadas; que alterações foram realizadas no percurso de formação/profissão; como a ocupação atual se relaciona ou não com o curso inicialmente escolhido. Essa pesquisa se dá pela preparação coletiva de roteiro-base para entrevistas, adequado por cada um dos alunos, visando à aproximação com questões por vezes ainda não tratadas no âmbito familiar, que podem enriquecer as reflexões pessoais.

Já na 3ª série, o enfoque do trabalho de escolha profissional torna-se mais individualizado e o próprio currículo permite que os alunos entrem em contato e se aprofundem conceitualmente e metodologicamente em áreas de estudos com as quais se identificam. Esse aprofundamento se dá por meio dos Cursos Temáticos e do trabalho de Monografia realizados ao longo do ano.

Nos Cursos Temáticos, a intenção é trabalhar temas interdisciplinares propostos pelos professores, buscando responder, de uma forma mais ampla, a alguma questão que tenha surgido dos conteúdos de suas matérias ou do currículo da escola. Cada aluno escolhe dois cursos por semestre. Neste ano, foram oferecidos: História e Cinema; Juventude, Identidade e Contemporaneidade; A Cidade de São Paulo: Desafios e Possibilidades; Arte e Contemporaneidade; Nossa Vida com Ciências; e Religião, Conhecimento e Ideologia.

A Monografia é um trabalho de pesquisa pessoal. A partir dos eixos temáticos propostos pelos professores orientadores, os alunos devem escolher sua própria temática, recortar uma questão de investigação teórica e/ou aplicada e, ao final do processo, devem elaborar um texto autoral e analítico sobre seu tema e realizar uma apresentação oral para a comunidade escolar. Muitas vezes é nesse estudo de uma área ou tema que nossos alunos encontram objetos de interesse nos quais gostariam de se aprofundar ao término do Ensino Médio.

Além dessas situações curriculares, é também proposta na 3ª série uma pesquisa mais direta sobre profissões. Cada aluno deve escolher uma frente de investigação, realizar a pesquisa, escrever um texto e relatar para o grupo suas conclusões. As frentes investigativas são:

  • formação nos cursos pelos quais tem interesse em seguir (como os currículos são organizados, estágios, vida acadêmica);
  • expectativas da própria família em relação às suas escolhas (o que pensam seus pais, como pretendem participar desse momento); e
  • mundo do trabalho (identificação das várias áreas de atuação dentro da profissão, visita a locais de trabalho, entrevista com profissionais).

Essa pesquisa é subsidiada por visitas de grupos de alunos a algumas faculdades. Ali eles conversam com professores e alunos sobre os cursos, a vida acadêmica e as perspectivas de atuação profissional.

Como pode ser relatado, o currículo do Colégio Equipe contempla momentos articulados ao longo das três séries do Ensino Médio, para que os alunos reflitam sobre a escolha profissional, aprofundando e particularizando esse exercício nesse período. Essa proposta pode não atender às necessidades de todos. Alguns não conseguem responder com segurança, ao final da 3ª série, em qual curso se inscreverão ao prestar vestibular. Mas o importante, para nós, é que todos os nossos alunos tenham, no decorrer desse processo, pensado sobre seus projetos, desejos, sonhos e nos meios que podem encontrar para realizá-los futuramente. Nosso trabalho é oferecer “ferramentas” – aprendizagens, conceitos, leituras de si mesmo e do contexto social em que vivem – para que encontrem satisfação no que fazem e no que irão fazer, e que se sintam e sejam socialmente úteis.

 

Luciana B. Fevorini e Graça Maria Marino Totaro
Orientadoras Educacionais e Pedagógicas do Ensino Médio