Entrevista no trabalho de campo em Santos

A função formativa da entrevista nos trabalhos de campo

 

DSC_0104Fotos do Prof. Maurício Freitas

 

O Colégio Equipe realiza há mais de vinte anos projetos interdisciplinares no seu currículo, sendo os trabalhos de campo uma das atividades dessa modalidade. Foi uma das primeiras escolas em São Paulo a desenvolver esta prática educacional e, hoje, os projetos se tornaram uma das principais referências curriculares do trabalho da escola, na medida em que são marcos organizadores do processo de aprendizagem dos alunos em cada ano ou série, assim como dos conteúdos das disciplinas.

São elaborados tendo como referência a concepção crítica de educação e articulados à metodologia problematizadora de ensino. Na nossa concepção, eles favorecem que os alunos realizem leituras de aspectos importantes do contexto social em que vivem e desenvolvam um pensamento crítico em relação a ele.

A partir do 2º ano do Ensino Fundamental, os alunos do Colégio Equipe participam de trabalhos de campo.  Essas atividades são acompanhadas por professores, pela orientação pedagógica e educacional e por monitores – alunos de ciclos mais velhos da escola que participam de cursos e reuniões para exercerem a função. Os monitores acompanham os alunos em campo bem de perto, tirando dúvidas, provocando reflexões e conversas, organizando o trabalho coletivo.

Entendemos os trabalhos de campo como uma prática de pesquisa, que extrapola a viagem em si. A construção do objeto de pesquisa tem início bem antes de os alunos irem a campo e se dá por meio da proposta de uma questão norteadora para o trabalho, da exploração de fontes de pesquisa, da vivência de procedimentos (elaboração de roteiros de entrevistas e sua realização, produção de levantamento funcional, levantamento e análise de dados, etc.), do manuseio de instrumentos (bússola, barômetro, etc.).

A escolha dos projetos como metodologia de ensino permite a composição de um trabalho coletivo, proposto e orientado pelos professores e, ao mesmo tempo, dá lugar a expressão das singularidades, do olhar que cada turma e cada aluno lança para o objeto de pesquisa. É assim que é possível observar nas situações de socialização dos trabalhos, por exemplo, uma mesma questão respondida de diferentes formas, dependendo das fontes analisadas e da interpretação que os alunos atribuem a elas.

 

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Durante a pesquisa, os alunos trabalham em duplas ou trios que compõem grupos. Essa configuração visa a ampliar a interação e contribui para a elaboração de um trabalho coletivo. Trata-se de uma estratégia que leva os alunos a compartilharem seus saberes e aprendizados, bem como a discutirem com os colegas a partir de pontos de vista diferentes sobre o mesmo objeto.

No último mês de junho, os alunos do 7º ano do Ensino Fundamental II foram a Santos para participar de um trabalho de campo. A questão norteadora da pesquisa Santos: portas abertas para quem e para onde? foi proposta pelos professores das disciplinas de Ciências, Geografia, História e Projetos.

Uma das técnicas de pesquisa que os alunos aprendem nesse trabalho é a entrevista. O aprendizado dessa técnica é introduzido no 7º ano e aprofundado em outros trabalhos de campo ao longo da escolaridade. Na pesquisa em questão, os alunos entrevistaram moradores da cidade de Santos para obter informações sobre ela. O roteiro é composto basicamente por questões que buscam evidenciar o perfil dos entrevistados e por outras em que eles nos fornecem informações, dados, revelam suas formas de ver e viver a cidade. Entendemos os entrevistados como coautores da pesquisa, como sujeitos que têm algo a nos dizer como qualquer outra fonte de pesquisa.  

Antes da viagem, os alunos elaboraram, sob a orientação da professora de Projetos, o roteiro da entrevista a partir de critérios condizentes com a questão norteadora, dos dados coletados previamente sobre a cidade e da análise de roteiros-referência. Das atividades iniciais que abordaram a função e a formulação de entrevistas em diferentes esferas sociais até o roteiro final, cria-se um processo de levantamento dos saberes e das experiências dos alunos, de suas curiosidades, de adequações de linguagem e de pertinência das perguntas à pesquisa em questão, de ampliações, cortes, revisões…

 

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Ainda em São Paulo, propusemos que os alunos realizassem uma adaptação do roteiro para que, em duplas ou trios, entrevistassem os funcionários do Colégio. Com essa atividade, tínhamos como objetivo que os alunos refletissem sobre a postura do entrevistador e participassem efetivamente de uma interação social.

Na socialização do que havia sido essa experiência, os alunos compartilharam dúvidas, dificuldades, acertos, hipóteses, levantaram problemas que poderiam surgir no campo e apresentaram possíveis encaminhamentos a eles. Durante a conversa, observamos que a atividade proposta permitiu que os alunos conhecessem os funcionários melhor, vivenciassem e estranhassem momentos em que tiveram dificuldade em estabelecer a interlocução e refletissem sobre eles.

Em Santos, os alunos realizaram as entrevistas com pessoas que circulavam no centro comercial. Cada aluno deveria participar de pelo menos duas entrevistas: numa situação atuaria como entrevistador e noutra, produziria o registro das respostas dadas pelo entrevistado. Sabemos que essa divisão de tarefas não ocorre na prática, porque a vontade de interagir com o entrevistado faz com que quem esteja anotando queira perguntar, mas entendemos que a orientação seja importante para favorecer a organização dos registros.

 

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No final de cada dia de atividades em campo, realizamos plenárias – reuniões que contam com a presença de alunos, monitores, professores e orientadores. A atividade tem como objetivo que os alunos socializem o que vivenciaram e reflitam com todo o grupo sobre seus aprendizados do dia.

Uma das tarefas da plenária proposta pelos professores no dia em que as entrevistas foram realizadas foi que cada grupo de alunos reunido compartilhasse os dados obtidos a partir das entrevistas: traçassem o perfil dos entrevistados e analisassem, ainda que de forma pouco sistemática, as respostas dos entrevistados.

 

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Na Plenária, dentre os elementos mencionados por eles está o baixo nível de escolaridade dos entrevistados. Alguns alunos estranharam que as pessoas que entrevistavam eram mais velhas que eles, mas apresentavam níveis de escolaridade mais baixos. Chamou nossa atenção o fato de alguns alunos terem notado esse dado ainda durante a entrevista. Comentaram que tiveram vontade de fazer mais perguntas para saber mais sobre o tema, mas apresentaram dificuldade em formulá-las. E explicaram que a dificuldade não se daria em elaborar a pergunta, mas em elaborá-la de forma que os entrevistados não se sentissem constrangidos.

Demos uma breve orientação aos alunos durante a plenária, mas sabíamos que a questão levantada por eles merece abordagem metodológica mais aprofundada. De volta ao Colégio, retomamos as anotações que produziram em campo e a questão relativa ao perfil dos entrevistados. Apresentamos dados sobre os níveis de escolaridade no Brasil, no estado de São Paulo e no município de Santos e propusemos que os alunos os comparassem e elaborassem hipóteses sobre o fenômeno que observaram.

 

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Com base nisso, na próxima semana, vão elaborar um novo roteiro de entrevista. Agora, para entrevistar a diretora pedagógica da escola, Ausônia Donato, pesquisadora nas áreas de educação e de saúde pública. A atividade tem como objetivo levar os alunos a verificarem suas hipóteses para explicar os dados que apontam o baixo índice de escolaridade da população brasileira numa conversa com uma especialista sobre o tema.

Essa entrevista e textos que veiculem a análise de dados coletados em campo, a exploração de outras fontes de pesquisa e que busquem responder a questão norteadora do trabalho de campo serão publicados em uma revista digital e socializados em atividades a serem realizadas com a comunidade escolar.

 

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Celina Fernandes
Orientadora Pedagógica e Educacional do Ensino Fundamental II